quarta-feira, 8 de agosto de 2012

O que achei de Na Estrada


Na Estrada, adaptação do livro On The Road, do Kerouac, foi o filme que aguardei com maior ansiedade desde Pergunte ao Pó, também adaptação (bem fraca) de um livro que me marcou. Ao contrário de muitos fãs de On The Road, não saí do cinema desapontado. A resenha abaixo foi publicada na edição da semana passada de O Caxiense. A propósito, com o tempo vou postando aqui algumas matérias que faço na revista. 

Salles não é Kerouac. E por que deveria ser?


Adaptar para o cinema um livro que não possui apenas leitores, mas sim seguidores – o rótulo de "bíblia de uma geração" não pode ser mais adequado aqui – é um desafio que tem tudo pra dar errado. E para muitos que já foram ao cinema assistir Na estrada, adaptação do livro On the road, de Jack Kerouac, deu mesmo. A versão dirigida por Walter Salles tem dividido opiniões de espectadores e críticos, provocando discordâncias inevitáveis sempre que uma obra sagrada é maculada.

Publicado em 1957, On the road é bíblia por eternizar a trajetória de uma geração de jovens norte-americanos que, no fim dos anos 40, de mochila nas costas, buscou um caminho às margens da sociedade de consumo, vivendo sem regras e sem rumo, de carona em carona, apenas vivendo, loucos apenas por isso: viver. Essa turma, que nomeou a si mesma geração beat (a hipótese mais consistente do porquê do nome é ser o radical da palavra beatitude – alusão a uma certa iluminação mística oriental contida no pensamento dos beatniks, os integrantes daquele grupo de escritores e poetas), ditou novos caminhos para toda uma geração, e depois outra e nunca mais parou. Sempre vai haver um pouco de Kerouac em cada hippie de qualquer época. As viagens de Sal Paradise (alterego do autor) e Dean Moriarty (inspirado em Neal Cassady, amigo de Kerouac) viraram roteiro de peregrinações de apaixonados pelo livro de todo o mundo e o livro, publicado em 1957, foi decisivo para Bob Dylan e Jim Morrison, por exemplo, se tornasem os artistas contestadores e livres que foram.

Os temas que tornam universal a saga de Sal Paradise – a jornada do herói em busca de um sentido para viver e a dramática busca pelo pai (vivida por Dean, o verdadeiro protagonista) – o que fascina o leitor de On the road há mais de meio século (no Brasil, trata-se do livro mais vendido da coleção pocket da editora L&PM). Na estrada, o filme, é fiel do início ao fim. Tudo o que os fãs do livro (entre os quais me incluo fortemente) idolatram está lá: a estrada, o jazz, as drogas e o sexo, seja ele a dois, a três ou apenas uma dupla masturbação no carro. Mas há também o drama e a melancolia que dá início e fim à geração beat, que talvez por não saber para onde ir, não tenha mesmo ido a lugar algum. Vale citar que Jack Kerouac, o papa dos beats, morreu afundado em depressão profunda, transformado em um reacionário e negando a importância de tudo o que realizou.

Não dá para exigir que o expectador deixe o cinema com a mesma empolgação daqueles que terminaram a última página de On the road, decididos a mudar algo em suas vidas. São experiências totalmente diferentes, a começar pelo tempo: comparar duas horas numa sala em frente a uma tela com alguns dias e noites mergulhados em mais de 300 páginas parece inadequado. Finalmente, não sei que impacto pode ter o filme para quem não teve contato com a obra original. Talvez seja chato, maçante e sem sentido (o roteiro poderia contextualizar melhor o cenário em que se dão as loucuras daquela turma). Para este leigo em cinema, mas fã dos beats, valeu a pena. Se você já leu o livro, corra para o cinema. Se não leu, ainda é melhor correr para a livraria.  

Um comentário:

  1. Vi o filme sem ler o livro. Gostei da essência, das estórias, das atuações, das imagens e da trilha sonora, mas tudo soa muito fragmentado e apresado. Não espaço para profundidade, talvez, por isso, para quem não leu o livro, o filme não feche (é como se precisa-se ler o livro para se entender completamente o filme, algo que eu não achei muito bom. Ainda assim, o filme é correto e interessante, mas não chega à ser uma grande obra.

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