quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Breve retrospectiva pessoal de 2011

Chegando ao fim de mais um ano, é hora de puxar pela memória e relembrar o que mais me marcou nestes últimos 12 meses (acreditando que nada muito significativo venha a ocorrer nas próximas semanas). E sugerir aos amigos que façam suas próprias retrospectivas, certamente bem mais interessantes do que as que veremos na TV nos próximos dias.

Melhor música: Empate técnico entre Rumour Has It, da Adele, e Sinhá, do Chico com o João Bosco (que, convenhamos, não é uma parceria, mas sim uma covardia).

Melhor álbum: Wynton Marsalis & Eric Clapton Plays The Blues. Por reunir dois dos meus músicos preferidos celebrando o meu gênero musical preferido, reafirmando-o como tal. No link dá pra ouvir tudo.

Melhor filme: O drama Minhas Mães e Meu Pai, que embora seja de 2010, concorreu ao Oscar este ano, e foi mais ou menos nessa época que eu assisti.

Melhor livro: Rum: Diário de um Jornalista Bêbado, do Hunter S. Thompson. Sensacional, li em dois dias, coisa rara de acontecer.

Melhor show: Não fui a muitos neste ano, é verdade, mas sem dúvida o Chico, no último dia 29, foi histórico (e caro, por isso tenho que escolhê-lo). Destaque absoluto pro arranjo de Geni e o Zepelin, como mostra o vídeo gravado neste dia (mas não por mim).

Melhor crônica: Essa da Eliane Brum no site da Época : Meu filho, você não merece nada

Melhor dia: 3/11, quando eu finalmente passei na prova prática da auto-escola e fui reconhecido pelo Detran como um legítimo condutor de veículos automotores(pode parecer banal, mas foram uns seis meses de espera entre burocracias, provas mal-sucedidas, demissões de examinadores, etc, e o que é mais enlouquecedor: com o carro comprado!).

domingo, 4 de dezembro de 2011

Vida: Mata-mata ou pontos corridos?

Tomo emprestado do futebol a metáfora que pode ajudar a entender como avaliamos nossa safisfação com a existência: Sua vida, amigo leitor, é vivida em mata-mata ou pontos corridos?

São estas as duas principais formas de disputa dos torneios futebolísticos. A primeira é eliminatória, como a Copa do Brasil, aquela em que uma equipe elimina a outra em confronto direto, até a partida final, que consagra o campeão. Na outra, todas as equipes se enfrentam, e vence quem soma mais pontos no final. Como o Campeonato Brasileiro.

O mata-mata mantém suspensas as comemorações pelas pequenas vitórias,uma vez que só o triunfo final dará sentido a estes suados triunfos. A euforia de uma vitória em quartas-de-final pode ser reduzida a pó se no domingo seguinte o time perder nas semifinais. Um jogo ruim, um dia de azar, acaba com toda uma campanha que se desenhava exitosa.

Nos pontos corridos, os três pontos da partida final têm a mesma importância daqueles disputados no jogo de estreia na competição e de todos os outros. O que torna todos os jogos decisivos, ainda que nenhum seja eliminatório. É permitido tropeçar, desde que se reequilibre antes do tombo para seguir em frente.

Aplicando tais regras ao nosso cotidiano, considero que vive sob as regras do mata-mata aquele que deixa de saborear as pequenas conquistas da vida, pois não vê sentido em comemorar vitórias tão frágeis, que podem desaparecer ao primeiro tropeço logo adiante. Tudo são projeções para um futuro que possa dar sentido ao presente, e só no final irá descobrir - ou decidir - se foi feliz ou não.

O sujeito adepto dos pontos corridos, por sua vez, sabe que a felicidade é feita de alegrias efêmeras e fugidias, com fim unicamente em si mesmas, e independem de um futuro glorioso. Por saber viver o presente, comemora o dia em que tudo o que obteve foi a condição de ter uma noite tranquila de sono. E seus dias ruins jamais irão anular a lembrança dos dias bons que se passaram.

Dadas as opções, reitero a pergunta: que fórmula você escolheu? Viver à espera do resultado final, para avaliar se a vida deu certo ou errado, ou colher do presente, a cada dia, um pouco da felicidade que se pode ter?

domingo, 27 de novembro de 2011

Morar sozinho

Nestes pouco mais de três anos como habitante único dos endereços por onde passei, descobri algumas coisas sobre esta valorosa arte de morar sozinho.

A principal delas, acredito, é que morar sozinho é como ser o único ator em um espetáculo repleto dos mais diversos personagens do cotidiano. E mesmo tendo que se virar para representar a todos, ser ainda sua própria platéia.

Mais do que tentar ser um pouco cozinheiro, diarista, eletricista e encanador, é ser seu próprio psicólogo, quando você está deprimido e não encontra saídas para uma vida feliz.

É ser seu próprio enfermeiro, quando a doença atinge o corpo e é preciso controlar o repouso, preparar a canja, tomar os remédios com seus devidos intervalos de tempo.

É ser sua própria mãe, para reclamar dos horários, mandar dormir um pouco mais cedo, sugerir as contenções de despesas.

É também tentar ser seu amigo, tanto o que te faz rir, quando sentir que falta um pouco de diversão, quanto o que te convence a sair de casa em uma noite preguiçosa.

Morar sozinho pode ser a melhor escolha de sua vida. Da minha, acredito que tenha sido. Mas ao mesmo tempo em que nos oferece certa independência das regras familiares, nos torna ainda mais dependentes de nós mesmos.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Traumas musicais

Há uma triste verdade sobre as músicas que gostamos. Por mais que a gente queira, elas jamais servirão para funções nobres como as de despertador e toque de celular.

Já faz algum tempo que insisto em ser acordado por músicas legais e empolgantes, acreditando que isso possa tornar menos árduo esse momento crítico do dia. Mas não só isso não funciona, como recentemente precisei remover Give it away, do Red Hot Chili Peppers, da minha playlist por puro trauma.

Acostumei então a escolher um som de alarme sabendo que logo terei de dizer adeus, como em qualquer relação desgastada. É uma escolha difícil. Hoje acordo com Purple Haze, do Jimi Hendrix, sabendo que logo ela se tornará antipática, bem como aquelas que nos lembram amores mal-resolvidos.

Com toques de celular as experiências são ainda piores. Talvez por eu não apreciar receber ligações em geral, o som do toque me remete ao chefe que liga durante a folga, ao amigo que me chama empolgado em um dia preguiçoso, às inevitáveis e imprevisíveis más notícias da vida. E foi por isso que nos últimos tempos excluí de minhas listas Fly Away, do Lenny Kravitz, Higher Ground, do Stevie Wonder (com dor no coração), e Night Time is The Right Time, do Ray Charles (e da minha formatura), entre outras que no início até me faziam deixar o celular tocando por um tempo maior que o necessário.

Acredito que na época dos toques polifônicos ocorresse o contrário. Ouvir aquela singela simulação de uma música que gostássemos dava vontade de ouvir o som verdadeiro. Escolhemos músicas para despertador e toque sabendo que logo nos deixarão traumatizados, como as que ouvimos diariamente na abertura da novela.

É verdade que, apesar dos pesares, não abri mão ainda de tornar musicais estes momentos do dia-a-dia. Se hoje o leitor me ligar, atenderei ouvindo We’re Gonna Groove, do Led Zeppelin. Mas dificilmente ouvirás esta bela música em uma festa na minha casa em um futuro próximo.

domingo, 6 de novembro de 2011

Vocês que bebem pra esquecer

Admiro com certa inveja todos vocês que bebem pra esquecer. Pelo mesmo motivo que invejo os bons tocadores de harmônica: por simplesmente não dominar a arte.

Ainda que sem poder oferecer qualquer explicação convincente, sempre que tenho mágoas a afogar, opto por permanecer sóbrio, para absorver toda a melancolia ao invés de despejá-la por aí.

Da mesma forma que não sou um bom conselheiro para os amigos que por ventura precisem ser aconselhados, sou fraco para receber conselhos. Desabafo comigo mesmo e sou o meu pior juiz.

Admiro e invejo quem recebe uma má notícia e vê nela antes de tudo um motivo para encher a cara à noite.

Às intempéries da vida, reajo com não recomendável preguiça existencial. E sou da turma que até para beber uma cerveja precisa de um pouco de motivação.

Sou anti-social nas más horas. Por algum motivo, sinto que um grande problema tira o direito de me sentir bem. Expurgo os fantasmas com doses fortes de reclusão, café e um pouco de blues. E mesmo do prazer das palavras, lidas ou escritas, preciso me distanciar.

Se você enche a cara para esquecer, não importando se esquece de fato ou não, saiba que o admiro e invejo profundamente.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

A era do ser banalizado

Nem sempre foi assim, mas em algum momento todos ficamos acostumados a ter nossos amigos e conhecidos disponíveis a qualquer momento, nestes sistemas de troca de mensagens instantâneas pela internet, como MSN e os chats do Gmail e do Facebook, por exemplo.

A toda hora, nas redes sociais, mantemos nossos amigos atualizados sobre nossa rotina e acompanhamos os pormenores do que se passa na vida deles. Estamos por dentro de tudo, desde suas mais profundas crises existenciais até a hora da consulta no dentista.

Acredito que um efeito colateral da comunicação pelas redes sociais, ou mesmo pelo Messenger, seja uma certa banalização de nós mesmos. Não ficarão nossos amigos enjoados de nós, que estamos o tempo todo diante de seus olhos, representados pelo nosso simpático e sorridente avatar, que passa o dia invadindo telas?

Quando passamos manhã, tarde e noite conectados, estamos nos colocando à disposição em tempo integral, logo dando motivos para não sermos procurados. E narrar nossa rotina no Facebook ou no Twitter pode fazer de nós pessoas aparentemente maçantes e cansativas.

Há algum tempo reparei que tenho sentido mais saudade de pessoas que normalmente não me fariam tanta falta, pelo simples motivo de que raramente tenho contato virtual com elas. Creio que só a superexposição nas timelines alheias pode fazer com que pessoas legais se tornem mais superficiais do que outras nem tão interessantes, porém menos assíduas no cotidiano virtual.

Como há alguns anos, quando a moda era dar toque no celular. Recebíamos toques e achávamos isso legal, pois alguém lembrara de nós. Mas se passávamos a receber esses toques repetidas vezes, da mesma pessoa, cedo ou tarde acabava o encanto, e então reclamaríamos do pé no saco que não tinha mais o que fazer. Só é legal até banalizar. E nossa atual onipresença na rede banaliza tudo.

Desde o Orkut, em 2004, que sou um entusiasta das redes sociais. Mas tento usá-las com moderação, mesmo quando a vontade é de sair falando o que dá na telha. Pois em que mundo não virtual nós seríamos capazes de suportar a fala de nossos conhecidos sem nenhum intervalo que não seja o do sono obrigatório?

Finalmente, deixo aqui a dúvida. Será que estamos deixando de ser pessoas legais e nos tornando chatos descartáveis, sempre disponíveis para o papo e que tudo contam a quem queira ou não saber?

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Barrados no avião

Matéria deste blogueiro publicada no Pioneiro de quarta-feira (19), e na Zero Hora de quinta-feira (20)

A expectativa de um passeio ao Nordeste se transformou em uma grande dor de cabeça para uma família de Bento Gonçalves. Tudo porque, uma semana antes do embarque, a companhia aérea impediu que a filha de três anos do comerciante Volnei Pertile e de sua esposa, Eliane, embarcasse junto com eles e seus outros dois filhos para Porto Seguro (BA).

A pequena Maria Luísa é portadora de paralisia cerebral, causada por um acidente de trânsito quando ela tinha apenas sete meses de idade. Para que pudesse levá-la à viagem, a família obteve um laudo médico, exigido pela companhia, atestando que a menina estava apta a embarcar.

O documento foi aceito, mas a surpresa veio na última sexta feira (14), quando um e-mail enviado pela Gol Linhas Aéreas retificava a posição anterior, afirmando que o caso fora reavaliado por uma junta médica, e que, por questões de segurança, não seria permitido que a criança embarcasse com os pais.

Sentindo-se vítima de discriminação, a família tentou negociar, mas não obteve sucesso. Apoiada então em uma resolução de 2007 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que obriga as companhias aéreas a se adequar às necessidades das pessoas portadoras de deficiência, Pertile entrou com uma ação judicial contra a companhia.

– Maria Luísa tem dificuldades motoras, mas um acento de três pontas já seria suficiente para que ela pudesse viajar. Não encontramos uma explicação plausível, técnica ou jurídica para essa posição da empresa – afirma o advogado da família, Adroaldo Dal Mass.

O pai diz que, em consulta a outras companhias aéreas, obteve de todas elas a autorização para a viagem da pequena. Porém, a família aguarda para os próximos dias o resultado do pedido de uma liminar que pode permitir o embarque pela Gol.

– Hoje (ontem), me ligaram oferecendo desconto e uma maca para a minha filha viajar. Mas nossa luta agora não é mais pela viagem, mas sim pelos direitos da pessoa especial – comenta Volnei.

Em nota enviada à reportagem, a Gol Linhas Aéreas confirma ter oferecido ao cliente a possibilidade de transportar a criança em uma maca, e que as exigências da empresa estão em consonância com as normas de segurança estabelecidas pelas Autoridades Aeronáuticas.

sábado, 15 de outubro de 2011

Queridos mestres

Muitos dos meus seres humanos preferidos são professores. E alguns dos mais importantes também. Hoje percebo como não são apenas os colegas que me fazem falta nas salas de aula da vida. Os bons professores também sabem se tornar companhias imprescindíveis.
Não se constrói um bom ser humano sem bons professores. E os bons seres humanos que leem esse blog sabem que jamais esquecemos a convivência que tivemos, ou ainda temos, com nossos queridos mestres de toda a vida.
De todos os meus bons professores, fui melhor como amigo do que como aluno. Poucas vezes na vida fui bom aluno, pois meu interesse pelas aulas ia e voltava de tempos em tempo, sem que eu fizesse muito para mantê-lo além do estritamente necessário.
Mesmo assim, credito muito dos melhores traços da minha personalidade aos mestres com quem tive a oportunidade de aprender um pouquinho. Da pré-escola ao Trabalho de Conclusão na faculdade, aprendi a observar o mundo da forma como eles me sugeriam, chegando até a pegar o jeito deles falarem, daquela forma meio inconsciente com que isso acontece.
Acredito que os melhores professores são aqueles com quem aprendemos a gostar de algo que não sabíamos que poderíamos gostar. A paixão pela matéria que ensinam, aliada a algum carisma, sempre nos convence.
Sem citar nomes, para não cometer o pecado de esquecer alguém por pura falha da memória, aproveito as últimas horas deste Dia do Professor para dar, em forma de palavras, um imenso abraço nos queridos mestres que tanto me ensinaram. E pelo carinho que dispenso a todos eles, sei que citá-los aqui seria só um detalhe.

domingo, 9 de outubro de 2011

Crie a sua Apple

Os amigos leitores provavelmente já assistiram ao vídeo que mostra o belo discurso proferido por Steve Jobs aos formandos de Stanford, em 2005.

Embora em boa parte do texto o criador da Apple fale sobre o já surrado tema da importância de “fazer aquilo que amamos”, o discurso traz algumas reflexões muito legais, que, como sempre, se tornam mais sérias quando o autor se vai desse mundo (Jobs faleceu na última quarta-feira).

Assisti ao vídeo há algumas semanas, quando o assunto do dia era a renúncia de Steve Jobs ao cargo de CEO da sua Apple. E lembro-me de ter gostado principalmente de um trecho em que ele sugere como é possível ter aquela epifania que provoque a vontade de mudança diante da insatisfação:

"Quando eu tinha 17 anos, li uma citação que dizia algo como 'se você viver cada dia como se fosse o último, um dia terá razão'. Isso me impressionou, e nos 33 anos transcorridos sempre me olho no espelho pela manhã e pergunto, se hoje fosse o último dia de minha vida, eu desejaria mesmo estar fazendo o que faço? E se a resposta for "não" por muitos dias consecutivos, é preciso mudar alguma coisa."

Confesso que esta última frase, principalmente, me atingiu em cheio. Creio que por me sentir provocado a pensar que a passividade diante do que não nos satisfaz é uma regra da vida bastante difícil de burlar, e a imaginar o peso que pode ter a repetição de uma resposta negativa sobre o valor do que estamos fazendo com e para a nossa vida.

Acredito que, se passamos longos períodos da vida insatisfeitos, o mais comum é sucumbir à preguiça até de pensar se está bom ou ruim, e, se estiver mesmo ruim, no que daria pra melhorar. A preguiça é a fonte maior da tristeza e a tristeza, por sua vez, é fonte do marasmo que nos faz querer desistir e esperar o tempo, o nosso tempo, passar.

Este trecho do discurso de Jobs, em especial, é um convite a pensar em mudar. É uma passagem que pode vir à tona sempre que nos questionarmos sobre o sentido de nossas escolhas. Podemos conviver, eu mesmo já escrevi, com dias ruins, de achar que não está legal ou valendo à pena. Mas este mesmo sentimento, por dias consecutivos, é a deixa para tentar mudar. Acreditando que há sempre algo novo para fazermos de nós mesmos.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Estranged

Até para os que continuam fãs deste Axl Rose quase cinquentão, como eu, o show do Guns no Rock in Rio foi frustrante. Em alguns momentos, chegou a ser irritante.

O atraso, a chuva, as chatas sessões instrumentais, mas principalmente a sucessão de erros (solo de Welcome..., letra esquecida em November Rain, intro de Patience, entre outros), tudo contribuiu para que os críticos se tornassem mais críticos e os fãs um pouco mais céticos quanto ao futuro da banda e, especialmente, do Axl, que cantou bem abaixo do seu normal atual (comparações com 20 anos atrás não se justificam e nem interessam).

Mas não vou esconder que curti bastante alguns momentos. Acho que Rocket Queen e Nightrain foram bem executadas, por exemplo, assim como Better, uma das minhas preferidas do Chinese Democracy. E, para este fã, o fato principal foi que a banda finalmente tocou Estranged, 18 anos depois. E foi a melhor do show. Abaixo, compartilho aqui com os amigos que já estavam dormindo quando tudo aconteceu.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Férias!

Amigos leitores, nos próximos 10 dias este blogueiro estará ausente, repondo as energias na terrinha (acesso pela estrada acima, foto by Leandro Salvador).

Como estarei o mais distante possível da vida online - antes que ela me transforme em meio homem-meio computador -, a tendência é que o blog não receba atualizações nestes dias. Nada grave.

Desejo que todos fiquem bem. Até a volta!


quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Seja menos ingênuo

O ingênuo sofre mais. A ingenuidade é a causa de quase todo sofrimento, bem como a expectativa é o motivo maior das piores frustrações.

O ingênuo carece de anticorpos para se defender da vida Quem optou por manter a ingenuidade da infância, este valor tão consagrado (pelos adultos), jamais encontrou o tão esperado final feliz, disso pode ter certeza o amigo leitor.

Se há um homem menos suscetível aos horrores da ingenuidade, este é o pessimista. Pois o otimista é sempre mais ingênuo, é o que menos desconfia e o que mais se ilude. E o pessimista não necessariamente acredita que vai dar tudo errado. Ele só parte do princípio que as coisas não têm muito por que dar certo.

Sei que é legal e correto ser otimista, apenas desconfio que não compense em longo prazo. Tento não ser ingênuo, não acreditar no discurso chato de que “tudo é possível, basta acreditar”, “quem acredita sempre alcança”, entre outros clichês do gênero.

Vale mais admitir que nem tudo é possível, acreditando ou não, e que quem acredita nem sempre alcança, geralmente fica no meio do caminho. Mas que mesmo assim pode valer a pena tentar.

Considerando como verdadeira a inerência do sofrimento à nossa condição, também é sabido que vivemos para sofrer o mínimo possível, buscando pequenas alegrias que compensem nossas piores certezas, e que nos satisfaçam cotidianamente. É o melhor que podemos fazer.

Para minimizar desilusões, um bom caminho é tratar a vida como um infindável combate contra a ingenuidade. E o pensamento cético é sempre a melhor arma.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Como vivemos


Seu maior medo era o amor. Viveu a fugir, escondeu-se o tempo todo deste temor. Nisso, a vida passou. E de toda forma, morreu de amor.*

*mini-conto escrito em 2008, descoberto recentemente nos arquivos da casa.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Amigos verdadeiros e senso comum


Se deixarmos, o senso comum irá nos convencer que o verdadeiro amigo estará presente sempre nas horas mais difíceis. Como o cão que nunca abandona o mendigo. Quando todos os outros se revelariam meros aproveitadores da boa fase que um dia vivemos, ele estará lá para sentir conosco a dor que sentimos. É um verdadeiro anjo, o amigo verdadeiro que compramos do senso comum.

Não precisamos e nem devemos cobrar de nossos amigos que eles estejam presentes nas horas ruins. Já defendi isso por aí. O amigo não tem que nada...apenas ser amigo, e as horas ruins não o tornarão mais verdadeiro.

Não se trata, absolutamente, de desconhecer o valor do auxílio que um amigo pode nos prestar quando uma profunda agonia parece prestes a nos derrubar a qualquer momento. Mas sim de reconhecer que esse que nos conforta nas horas ruins pode apenas ter uma habilidade que falta àquele que silencia.

Se sou incapaz de aconselhar, acalmar, sugerir soluções, isso me faz um mau amigo, um falso e aproveitador? Não acredito nisso. Ser um bom conselheiro também é questão de habilidade, tanto quanto dar aquela força na hora da mudança de apartamento. Da minha parte, sou tão descoordenado para a maioria das atividades braçais quanto para dar conselhos.

Cheguei a esboçar uma tese de que podemos reconhecer um bom amigo não pela disponibilidade dele de nos ouvir, mas pela nossa de contar a ele o que nos aflige. Mas até isso ia exigir que o amigo fosse um bom ouvinte, e acabaria por desvalorizar os que quase só falam. E jamais o desvalorizaria, justo eu, sempre mais ouvinte do que falante, e que por isso preciso de alguém que fale para que eu escute.

Amigo não é para ser útil. Para nos serem úteis, existem profissionais bem capacitados (ainda que muitas vezes cobrem caro). Amigo é pra compartilhar momentos bons e ruins, só bons, ou só ruins. E quando alguém diz que o amigo que o consola é amigo de verdade, pode estar desconsolando outro tão verdadeiro quanto.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Dia do sexo


Depois de um fim de semana agitado e um início de semana bastante corrido, um breve post musical é o que temos para o momento, amigos.

Hoje (terça, 6/9) é o Dia do Sexo. Vocês sabiam que existia o Dia do Sexo? É oficial, gurizada. E em véspera de feriado, o que não deixa de ser oportuno.

Portanto, um feliz Dia do Sexo a todos os amantes, sejam eles de uma vida toda, de uma noite apenas ou tudo o que estiver neste espaço de tempo.

E, finalmente, proponho às autoridades competentes que Sex Machine, do James Brown, seja considerada o Hino do Dia do Sexo.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Aos eternamente invejados


O amigo leitor talvez já tenha deparado por aí com alguém que se considera o umbigo do mundo. Uma dessas pessoas que se sentem muito vigiadas, além de um frequente alvo de inveja e fofocas.

Uma dessas pessoas que, como forma de desabafar pela inveja que pesa sobre seus ombros, esbravejam pelas redes sociais para que os outros cuidem de suas próprias vidas, que paguem suas contas para depois falarem delas. “Tua inveja faz a minha fama” elas gostam de dizer.

Como eu não acredito que haja tanta inveja assim espalhada por aí, ou não na mesma proporção que os que se sentem invejados imaginam, achei ótima e precisa esta frase do David Foster Wallace*, que hoje dedico a essas pobres vítimas do mau agouro crônico e das piores conspirações do universo:

“Você irá se preocupar menos com o que as pessoas pensam sobre você quando perceber o quão raramente elas fazem isso.”

E podem acreditar nisso.


*Autor do discurso sobre a liberdade de ver os outros, já postado aqui.

sábado, 27 de agosto de 2011

Somos todos endividados

Por querermos colher hoje os frutos daquilo que deixamos/esquecemos/preferimos não plantar no passado, percebo que todos temos incontáveis dívidas a cobrar de quem já fomos.

Pois tudo que nos cabe fazer da vida hoje tem uma ligação intrínseca com o que fizemos no passado. E por carregarmos o fardo de nossas escolhas, no futuro cobraremos deste que somos hoje ter feito um pouco melhor.

Pensei bastante sobre isso quando imaginei que seria ótimo tocar harmônica em uma banda de blues. Seria ótimo se não fosse impossível, pois nunca aprendi a tocar harmônica. Ora, se eu sempre gostei de blues e de gaitas de boca, por que, nestes anos todos, nunca aprendi a tocar? Deveria ter considerado a hipótese de que um dia tocar harmônica em uma banda de blues me faria feliz.

Hoje não estou com paciência, nem muito tempo, para ter aulas de harmônica. Por outro lado, se não quero que daqui a alguns anos tenha essa dívida para cobrar do meu eu presente, deveria ceder e finalmente aprender a tocar esse instrumento?

É mais ou menos o mesmo princípio de quando não queremos estudar, mas compramos a idéia de que no futuro pode ser importante ter estudado, e por isso estudamos. Ou não estudamos, e assim contraímos uma dívida, que só cobraremos de acordo com as necessidades ou desejos que surgirem com o passar dos anos.

Creio não se tratar de arrependimento, que seria desejar ter feito diferente. Mas sim de questionar, com maior ou menor grau de culpa, o que nos levou às escolhas que fizemos.

Pensar sob esse ângulo faz parecer que cobramos de outra pessoa, com vontades que em nada dizem respeito às nossas. Quando penso que deveria ter aprendido a tocar harmônica (é só um exemplo, dos mais simples e despretensiosos. A coisa pode ser bem mais séria), pareço cobrar uma herança não recebida. Como se não fossemos o mesmo, aquele que não quis aprender e o que agora queria tocar em uma banda de blues.

Afinal, o que resta para o eu presente fazer que não vá desapontar o igualmente importante eu futuro? Pensar que o eu futuro herdará aquilo que eu escolher hoje torna tudo um pouco mais relevante.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Ciúme

Parafraseando Guilherme de Almeida, que termina o poema O Ciúme dizendo, sobre sua amada, “tenho ciúme de quem não te conhece ainda, e cedo ou tarde te verás, pálida e linda, pela primeira vez”, vou contar que tenho sentimentos parecidos.

Um certo zelo velado pelas boas sensações que experimentamos e que não se repetem. Não para nós, mas apenas para os que ainda irão experimentá-las. Ciúme mais ou menos como o do poeta, ainda que mais singelo do que este irrecuperável ciúme da primeira visão de uma linda mulher.

Exemplos?

Ciúme da insegurança de quem vai sair de mãos dadas com a namorada pela primeira vez.

Da euforia de quem ainda vai passar no vestibular e ver seu nome no listão do jornal (só depois cai a ficha de que difícil mesmo é não passar na maioria dos vestibulares).

Da felicidade de quem dará início a muitas amizades de sala de aula, no colégio, na faculdade, onde for, e, sem que precise esforço, manterá as melhores.

Da irracionalidade de quem se tornará um fiel devoto de uma banda de rock (como eu fui duas vezes, pelo menos) e deixará crescer o cabelo, vestirá camisetas da banda, rasgará as calças, aprenderá a tocar um instrumento, formará uma banda com os amigos.

Do esforço de quem passará uma noite sem dormir apenas para descobrir como o dia amanhece (mais tarde viramos a noite ao natural e nem sempre é tão poético).

Tudo isso e muito mais já foi novidade em nossas vidas antes de se tornar comum. E poucas coisas guardam o sabor das primeiras vezes. O que não podemos reviver, desejamos que outros vivam igual. E não cansamos de falar o quanto foi bom. Mas só até onde o nosso ciúme permite.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Sobre linhas tênues

Com ou sem sombrinha, amigos leitores, difícil mesmo é se equilibrar nas cordas bambas da vida. Pelas linhas tênues que percorremos, o tombo parece sempre o próximo passo.

Vivemos, afinal, entre a agonia das longas saudades e o enfado do convívio diário.

Entre a timidez que desperta o interesse e a quietude inerte que entedia.

Entre a inteligência que faz amigos e o pedantismo que os afasta.

Entre a felicidade que contribui para a felicidade dos que gostamos e a euforia, tão somente.

Entre o otimismo, tão somente, e a ingenuidade da expectativas frustrantes.

Entre a paciência de esperar e a omissão de preferir não agir.

Entre a beleza que encanta e a beleza que intimida.

Entre o amor cuidadoso e preocupado e o apego obsessivo.

Entre o amor descuidado e o desamor.

Entre o amor como objetivo e o amor como objeto.

Entre as coisas ruins que fazem bem e as coisas boas que fazem mal.

As linhas tênues da vida são mesmo um convite ao tombo.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A gente mesmo, demais


- O senhor sabe o que é o silêncio? É a gente mesmo, demais.

(fala do jagunço Riobaldo em Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa)


Não parece haver busca mais compensadora na vida do que a do autoconhecimento. Conhece-te a ti mesmo, disse Sócrates, e quase toda a filosofia se dá a partir desse desejo que temos de reduzirmos nossa ignorância acerca de quem somos. Mas como pode, ao mesmo tempo, ser tão frustrante, ao ponto de ser perigoso, conhecer a si mesmo?

As poucas certezas que acumulamos tendem a ser pouco complacentes com o nosso projeto de vida. E não sermos o que achamos que seríamos talvez seja esse um dos grandes causadores das nossas maiores e mais verdadeiras tristezas.

Temos defeitos demais, erramos demais e nossas escolhas raramente estão certas. Temos todos os motivos possíveis para passar a vida arrependidos, se assim quisermos. E ainda passamos boa parte da juventude sob o pensamento de que éramos feitos somente para experimentar grandes coisas. Mas somos absurdamente comuns, e não é nada fácil se acostumar a isso.

A busca por conhecer a si mesmo é um prato cheio para o julgamento apressado, que impede uma proximidade maior da compreensão, que por sua vez seria um grande passo para nos tornarmos um pouco melhores. Mas, como já escrevi aqui, julgar é mais rápido e mais fácil - e por isso mais tentador - do que compreender. E o pouco que julgamos saber de nós mesmos se perde em uma série de conceitos equivocados.

É um tanto quanto irônico, mas nosso maior objetivo pode levar ao mais profundo abismo. O autoconhecimento, verdadeiro, é difícil de encarar. Que ele venha sempre fantasiado com belas máscaras parece até melhor.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Clapton vem aí

Com o ingresso para o tão esperado show do Eric Clapton em POA devidamente comprado, este blogueiro lista abaixo dez canções que ajudaram a fazê-lo gastar os inflacionados R$ 180,00 pelo bilhete (que é o mais barato possível). Como tudo na vida, também já foi mais barato ir a grandes shows na capital.

Sou um grande fã do Clapton desde que conheci o MTV Unplugged - lá pelos idos de 2002 - que ainda é o meu álbum preferido da discografia dele. Depois vem o From The Cradle, que é mais blues que qualquer outro. Também sou mais adepto das releituras do que das composições próprias do Slow Hand, tanto que a maioria dos sons abaixo não é de autoria dele, mas sim versões de clássicos como Love in Vain e Hoochie Coochie Man.

Abaixo, a lista com breves e dispensáveis comentários. Para ouvir, é só clicar no título.

- Nobody Knows You When You’re Down And Out Versão de um blues lá dos primórdios, da Bessie Smith, e que aparece bem trabalhada no MTV Unplugged. Além de ser linda, vale também pelo título.

- Ramblin’ On My Mind A minha preferida. Está no álbum Stages, mas há outras versões ao vivo e acústicas também bem legais. Espero que ele toque essa no show.

- Hoochie Coochie Man Um dos maiores clássicos de Willie Dixon, que é o compositor mais clássico do blues. Clapton gravou essa no ótimo From the Cradle, de 1994.

- How Long Blues Outra do From The Cradle, é um som acústico bem arrastado e legal de cantarolar a esmo por aí.

- Cocaine Daqueles sons com riffs e refrões marcantes, que são especialidade do Clapton, tipo Layla, Bad Love, Change The World, entre outras, esse é o que mais curto.

- Kindhearted Woman Releitura do grande Robert Johnson. A melhor versão é esta, ao vivo, no álbum duplo intitulado Blues.

- Wonderful Tonight O Clapton tem várias baladinhas que todo mundo conhece. Tears in Heaven, a maior delas, não me agrada muito. Mas Wonderful realmente emociona.

- Got You On My Mind - Na minha opinião, é uma das poucas que se salvam no fraco álbum Reptile, cuja turnê o trouxe a POA pela primeira vez, em 2001. Mas para quem comprou o CD, Got You... talvez valha todo o investimento.

- Before You Accuse Me - Acredito que a original seja do Bo Diddley. A primeira versão do Clapton está no álbum Journeyman, mas há várias outras, ao vivo e acústicas, todas bem pegadas. E o refrão é mais uma lição de vida que o blues nos ensina.

- Alberta Embora conheça praticamente toda a discografia, minhas preferências têm forte influência do MTV Unplugged. Não adianta querer disfarçar. Poderia citar ainda Hey, Hey, San Francisco Bay Blues, e por aí vai...mas Alberta representa bem a beleza do álbum.


domingo, 31 de julho de 2011

Li, reli e postei

O texto abaixo é sensacional. Um dos mais inspiradores que já li e um dos mais belos também. Trata-se do trecho de um discurso feito pelo escritor norte-americano David Foster Wallace a uma turma de formandos em Letras que o elegeu paraninfo, e que a revista piauí traduziu e publicou um mês após sua morte, por suicídio, em 2008.

Li A liberdade de ver os outros pela primeira vez há um ano, mais ou menos, e reli esta semana, em que muito se falou do DFW, graças à primeira tradução de um livro dele no Brasil. Se tiverem um tempinho, leiam, pois é de uma sabedoria incrível. Como um especialista sobre o autor definiu em um artigo de jornal, é uma "linda lição de ser gente".


A liberdade de ver os outros

Dois peixinhos estão nadando juntos e cruzam com um peixe mais velho, nadando em sentido contrário. Ele os cumprimenta e diz:

- Bom dia, meninos. Como está a água?

Os dois peixinhos nadam mais um pouco, até que um deles olha para o outro e pergunta:

- Água? Que diabo é isso?

Não se preocupem, não pretendo me apresentar a vocês como o peixe mais velho e sábio que explica o que é água ao peixe mais novo. Não sou um peixe velho e sábio. O ponto central da história dos peixes é que a realidade mais óbvia, ubíqua e vital costuma ser a mais difícil de ser reconhecida. Enunciada dessa -forma, a frase soa como uma platitude - mas
é fato que, nas trincheiras do dia-a-dia da existência adulta, lugares comuns banais podem adquirir uma importância de vida ou morte.

Boa parte das certezas que carrego comigo acabam se revelando totalmente equivocadas e ilusórias. Vou dar como exemplo uma de minhas convicções automáticas: tudo à minha volta respalda a crença profunda de que eu sou o centro absoluto do universo, de que sou a pessoa mais real, mais vital e essencial a viver hoje. Raramente mencionamos esse egocentrismo natural e básico, pois parece socialmente repulsivo, mas no fundo ele é familiar a todos nós. Ele faz parte de nossa configuração padrão, vem impresso em nossos circuitos ao nascermos.

Querem ver? Todas as experiências pelas quais vocês passaram tiveram, sempre, um ponto central absoluto: vocês mesmos. O mundo que se apresenta para ser experimentado está diante de vocês, ou atrás, à esquerda ou à direita, na sua tevê, no seu monitor, ou onde for. Os pensamentos e sentimentos dos outros precisam achar um caminho para serem captados, enquanto o que vocês sentem e pensam é imediato, urgente, real. Não pensem que estou me preparando para fazer um sermão sobre compaixão, desprendimento ou outras "virtudes". Essa não é uma questão de virtude - trata-se de optar por tentar alterar minha configuração padrão original, impressa nos meus circuitos. Significa optar por me libertar desse egocentrismo profundo e literal que me faz ver e interpretar absolutamente tudo pelas lentes do meu ser.

Num ambiente de excelência acadêmica, cabe a pergunta: quanto do esforço em adequar a nossa configuração padrão exige de sabedoria ou de intelecto? A pergunta é capciosa. O risco maior de uma formação acadêmica - pelo menos no meu caso - é que ela reforça a tendência a intelectualizar demais as questões, a se perder em argumentos abstratos, em vez de simplesmente prestar atenção ao que está ocorrendo bem na minha frente.

Estou certo de que vocês já perceberam o quanto é difícil permanecer alerta e atento, em vez de hipnotizado pelo constante monólogo que travamos em nossas cabeças. Só vinte anos depois da minha formatura vim a entender que o surrado clichê de "ensinar os alunos como pensar" é, na verdade, uma simplificação de uma idéia bem mais profunda e séria. "Aprender a pensar" significa aprender como exercer algum controle sobre como e o que cada um pensa. Significa ter plena consciência do que escolher como alvo de atenção e pensamento. Se vocês não conseguirem fazer esse tipo de escolha na vida adulta, estarão totalmente à deriva.

Lembrem o velho clichê: "A mente é um excelente servo, mas um senhorio terrível." Como tantos clichês, também esse soa inconvincente e sem graça. Mas ele expressa uma grande e terrível verdade. Não é coincidência que adultos que se suicidam com armas de fogo quase sempre o façam com um tiro na cabeça. Só que, no fundo, a maioria desses suicidas já estava morta muito antes de apertar o gatilho. Acredito que a essência de uma educação na área de humanas, eliminadas todas as bobagens e patacoadas que vêm junto, deveria contemplar o seguinte ensinamento: como percorrer uma confortável, próspera e respeitável vida adulta sem já estar morto, inconsciente, escravizado pela nossa configuração padrão - a de sermos singularmente, completamente, imperialmente sós.

Isso também parece outra hipérbole, mais uma abstração oca. Sejamos concretos então. O fato cru é que vocês, graduandos, ainda não têm a mais vaga idéia do significado real do que seja viver um dia após o outro. Existem grandes nacos da vida adulta sobre os quais ninguém fala em discursos de formatura. Um desses nacos envolve tédio, rotina e frustração mesquinha.

Vou dar um exemplo prosaico imaginando um dia qualquer do futuro. Você acordou de manhã, foi para seu prestigiado emprego, suou a camisa por nove ou dez horas e, ao final do dia, está cansado, estressado, e tudo que deseja é chegar em casa, comer um bom prato de comida, talvez relaxar por umas horas, e depois ir para cama, porque terá de acordar cedo e fazer tudo de novo. Mas aí lembra que não tem comida na geladeira. Você não teve tempo de fazer compras naquela semana, e agora precisa entrar no carro e ir ao supermercado. Nesse final de dia, o trânsito está uma lástima.

Quando você finalmente chega lá, o supermercado está lotado, horrivelmente iluminado com lâmpadas fluorescentes e impregnado de uma música ambiente de matar. É o último lugar do mundo onde você gostaria de estar, mas não dá para entrar e sair rapidinho: é preciso percorrer todos aqueles corredores superiluminados para encontrar o que procura, e manobrar seu carrinho de compras de rodinhas emperradas entre todas aquelas outras pessoas cansadas e apressadas com seus próprios carrinhos de compras. E, claro, há também aqueles idosos que não saem da frente, e as pessoas desnorteadas, e os adolescentes hiperativos que bloqueiam o corredor, e você tem que ranger os dentes, tentar ser educado, e pedir licença para que o deixem passar. Por fim, com todos os suprimentos no carrinho, percebe que, como não há caixas suficientes funcionando, a fila é imensa, o que é absurdo e irritante, mas você não pode descarregar toda a fúria na pobre da caixa que está à beira de um ataque de nervos.

De qualquer modo, você acaba chegando à caixa, paga por sua comida e espera até que o cheque ou o cartão seja autenticado pela máquina, e depois ouve um "boa noite, volte sempre" numa voz que tem o som absoluto da morte. Na volta para casa, o trânsito está lento, pesado etc. e tal.

É num momento corriqueiro e desprezível como esse que emerge a questão fundamental da escolha. O engarrafamento, os corredores lotados e as longas filas no supermercado me dão tempo de pensar. Se eu não tomar uma decisão consciente sobre como pensar a situação, ficarei irritado cada vez que for comprar comida, porque minha configuração padrão me leva a pensar que situações assim dizem respeito a mim, a minha fome, minha fadiga, meu desejo de chegar logo em casa. Parecerá sempre que as outras pessoas não passam de estorvos. E quem são elas, aliás? Quão repulsiva é a maioria, quão bovinas, e inexpressivas e desumanas parecem ser as da fila da caixa, quão enervantes e rudes as que falam alto nos celulares.

Também posso passar o tempo no congestionamento zangado e indignado com todas essas vans, e utilitários e caminhões enormes e estúpidos, bloqueando as pistas, queimando seus imensos tanques de gasolina, egoístas e perdulários. Posso me aborrecer com os adesivos patrióticos ou religiosos, que sempre parecem estar nos automóveis mais potentes, dirigidos pelos motoristas mais feios, desatenciosos e agressivos, que costumam falar no celular enquanto fecham os outros, só para avançar uns 20 metros idiotas no engarrafamento. Ou posso me deter sobre como os filhos dos nossos filhos nos desprezarão por desperdiçarmos todo o combustível do futuro, e provavelmente estragarmos o clima, e quão mal-acostumados e estúpidos e repugnantes todos nós somos, e como tudo isso é simplesmente pavoroso etc. e tal.

Se opto conscientemente por seguir essa linha de pensamento, ótimo, muitos de nós somos assim - só que pensar dessa maneira tende a ser tão automático que sequer precisa ser uma opção. Ela deriva da minha configuração padrão.

Mas existem outras formas de pensar. Posso, por exemplo, me forçar a aceitar a possibilidade de que os outros na fila do supermercado estão tão entediados e frustrados quanto eu, e, no cômputo geral, algumas dessas pessoas provavelmente têm vidas bem mais difíceis, tediosas ou dolorosas do que eu.

Fazer isso é difícil, requer força de vontade e empenho mental. Se vocês forem como eu, alguns dias não conseguirão fazê-lo, ou simplesmente não estarão a fim. Mas, na maioria dos dias, se estiverem atentos o bastante para escolher, poderão preferir olhar melhor para essa mulher gorducha, inexpressiva e estressada que acabou de berrar com a filhinha na fila da caixa. Talvez ela não seja habitualmente assim. Talvez ela tenha passado as três últimas noites em claro, segurando a mão do marido que está morrendo. Ou talvez essa mulher seja a funcionária mal remunerada do Departamento de Trânsito que, ontem mesmo, por meio de um pequeno gesto de bondade burocrática, ajudou algum conhecido seu a resolver um problema insolúvel de documentação.

Claro que nada disso é provável, mas tampouco é impossível. Tudo depende do que vocês queiram levar em conta. Se estiverem automaticamente convictos de conhecerem toda a realidade, vocês, assim como eu, não levarão em conta possibilidades que não sejam inúteis e irritantes. Mas, se vocês aprenderam como pensar, saberão que têm outras opções. Está ao alcance de vocês vivenciarem uma situação "inferno do consumidor" não apenas como significativa, mas como iluminada pela mesma força que acendeu as estrelas.

Relevem o tom aparentemente místico. A única coisa verdadeira, com V maiúsculo, é que vocês precisam decidir conscientemente o que, na vida, tem significado e o que não tem.

Na trincheira do dia-a-dia, não há lugar para o ateísmo. Não existe algo como "não venerar". Todo mundo venera. A única opção que temos é decidir o que venerar. E o motivo para escolhermos algum tipo de Deus ou ente espiritual para venerar - seja Jesus Cristo, Alá ou Jeová, ou algum conjunto inviolável de princípios éticos - é que todo outro objeto de veneração te engolirá vivo. Quem venerar o dinheiro e extrair dos bens materiais o sentido de sua vida nunca achará que tem o suficiente. Aquele que venerar seu próprio corpo e beleza, e o fato de ser sexy, sempre se sentirá feio - e quando o tempo e a idade começarem a se manifestar, morrerá um milhão de mortes antes de ser efetivamente enterrado.

No fundo, sabemos de tudo isso, que está no coração de mitos, provérbios, clichês, epigramas e parábolas. Ao venerar o poder, você se sentirá fraco e amedrontado, e precisará de ainda mais poder sobre os outros para afastar o medo. Venerando o intelecto, sendo visto como inteligente, acabará se sentindo burro, um farsante na iminência de ser desmascarado. E assim por diante.

O insidioso dessas formas de veneração não está em serem pecaminosas - e sim em serem inconscientes. São o tipo de veneração em direção à qual você vai se acomodando quase que por gravidade, dia após dia. Você se torna mais seletivo em relação ao que quer ver, ao que valorizar, sem ter plena consciência de que está fazendo uma escolha.

O mundo jamais o desencorajará de operar na configuração padrão, porque o mundo dos homens, do dinheiro e do poder segue sua marcha alimentado pelo medo, pelo desprezo e pela veneração que cada um faz de si mesmo. A nossa cultura consegue canalizar essas forças de modo a produzir riqueza, conforto e liberdade pessoal. Ela nos dá a liberdade de sermos senhores de minúsculos reinados individuais, do tamanho de nossas caveiras, onde reinamos sozinhos.

Esse tipo de liberdade tem méritos. Mas existem outros tipos de liberdade. Sobre a liberdade mais preciosa, vocês pouco ouvirão no grande mundo adulto movido a sucesso e exibicionismo. A liberdade verdadeira envolve atenção, consciência, disciplina, esforço e capacidade de efetivamente se importar com os outros - no cotidiano, de forma trivial, talvez medíocre, e certamente pouco excitante. Essa é a liberdade real. A alternativa é a torturante sensação de ter tido e perdido alguma coisa infinita.

Pensem de tudo isso o que quiserem. Mas não descartem o que ouviram como um sermão cheio de certezas. Nada disso envolve moralidade, religião ou dogma. Nem questões grandiosas sobre a vida depois da morte. A verdade com V maiúsculo diz respeito à vida antes da morte. Diz respeito a chegar aos 30 anos, ou talvez aos 50, sem querer dar um tiro na própria cabeça. Diz respeito à consciência - consciência de que o real e o essencial estão escondidos na obviedade ao nosso redor - daquilo que devemos lembrar, repetindo sempre: "Isto é água, isto é água."

É extremamente difícil lembrar disso, e permanecer consciente e vivo, um dia depois do outro.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Só serve pra sentir saudade

Certas coisas só servem pra sentir saudade. E só por isso as mantemos em nossas vidas, ainda que nem sempre em lugares devidamente arejados.

Toda vez que tento dar uma organizada nas gavetas, é a mesma história. O esforço para manter guardado um monte de coisa que não uso mais, mas que um dia servirão para sentir saudade.

Objetos sem função, muitas vezes sem nenhuma beleza e que ainda ocupam meu precioso espaço. Coisas que nem pra enfeite servem, como diz o personagem do Xico Sá no filme O Cheiro do Ralo, quando tenta vender um bonequinho numa garrafa, que “só serve pra fazer poesia”. Mas que simplesmente não consigo jogar no lixo.

Coisas que já dão certo aperto no coração, outras que, por este cronista ainda não ser tão velho assim, ainda nem deixaram saudade, mas que já estão programadas para saudades futuras. Como o rascunho do projeto do trabalho de conclusão da faculdade, por exemplo. Ia jogar fora, mas guardei.

Posso citar aqui os cadernos antigos, cheios de desenhos, redações e letras de músicas traduzidas. Já descartei muitos, mas é impossível que me desfaça de todos. Tão significativos quanto as fotos de infância e adolescência, estão ali meus traços a lápis e caneta, minhas ideias de toda uma época. Como pode não vir a ser valioso um dia, ainda que só para minhas próprias lembranças?

Para diversificar os exemplos, listo mais alguns: desde antigas camisetas que não servem mais, como a do time do colégio e a da formatura do 2º grau (a da faculdade ainda serve!), até coisas mais recentes, como o primeiro crachá ou as primeiras credenciais de imprensa.

A cada dia de limpar gavetas, uma pequena pilha de tralhas vai para o lixo. Outra, cada vez menor, é reorganizada e empurrada para o fundo, mas sempre é mantida. E se um dia perdê-las, será só uma saudade a mais. A das tralhas que me traziam saudades.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Do livro Despertar: uma vida de Buda

...você não deve praticar ações gentis em favor de um nascimento celestial, mas sim para que dia e noite, corretamente livre de pensamentos rudes, amando igualmente tudo que vive, você possa se esforçar para se livrar de toda a confusão da mente e praticar contemplação silenciosa; no fim, apenas isso traz benefício; além disso não há realidade.

Jack Kerouac, inspirado em ensinamento budista


O primeiro que pôr em prática ganha um bombom.



quarta-feira, 20 de julho de 2011

Feliz Dia do Amigo

Últimas horas de mais um Dia do Amigo, data que sempre me pega de surpresa. Alguém lembra, durante o ano, que o 20 de julho é o Dia do Amigo? Eu, definitivamente, não.

Dia de lembrar que meus grandes amigos estão espalhados por aí. Ou melhor, meus amigos e eu estamos todos espalhados por aí. Pela serra, pelo estado, pelo país, pelo mundo. Alguns não vejo há meses, outros não vejo há semanas, outros não vejo há alguns dias. Mas de todos eles, que saudades.

Consola este cronista que, se a vida impõe que nos vejamos cada vez menos, também permite que cada reencontro seja momento de rara felicidade, muito além do que a convivência cotidiana pode proporcionar.

Tenho amigos com quem só converso sobre futebol. Com outros o assunto é tão somente os dilemas e glórias da profissão. Alguns são aqueles com quem compartilho apenas impressões sobre as mulheres e seu universo todo particular. Há ainda os que invariavelmente me recordam da infância vivida junto, são minhas memórias em forma de amigo. E há, lógico, os inestimáveis, aqueles que não exigem que eu fale qualquer palavra que sirva apenas para legitimar presença.

Os amigos mais amigos são como uma fogueira que não precisa que joguemos lenha a todo instante para impedir que apague. Mas para abrir o leque das felicitações, proponho que hoje comemoremos o dia de todos os amigos. Pois as datas comemorativas estão aí para serem banalizadas, ora essa.

Portanto, se você já brindou comigo um gol do Grêmio no bar, Feliz Dia do Amigo. Se já fomos apresentados por um conhecido em comum e no dia seguinte acenamos um para o outro, Feliz Dia do Amigo. E se me conheceste com os cabelos loiros e lisos da infância, e tão somente nesta época, Feliz Dia do Amigo.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Breve post sobre desenhos

A notícia de que o saudoso Capitão Planeta finalmente terá o reconhecimento que sempre mereceu - irá virar filme - realmente mexeu com meu eu nostálgico. O que não é assim tão difícil, já que sou refém resignado da nostalgia. Mas não costumo ser nostálgico numa terça-feira à tarde.

É que o até hoje tão menosprezado Capitão Planeta foi um dos desenhos da minha infância. O preferido, ao lado da Corrida Maluca e do Scooby Doo. Mais tarde vieram Os Cavaleiros do Zodíaco, inesquecível, e o bom Marsupilami, que passava no Disney Club, assim como Doug. Tinha alguns que eu não gostava, mas eram bem poucos. Tom & Jerry, por exemplo.

Como era bom acordar cedo para assistir desenhos tomando leite com Nescau. Só depois de velhos conhecemos a preguiça e o ranço matinal. Triste era quando o cozinheiro da TV Colosso chamava para o almoço. Lembram?

À distância, os desenhos de hoje parecem muito estranhos, non sense total. Não sei nem citar nomes, mas passem os olhos pela TV Globinho ou algum outro programa infantil um dia e comprove.

Será que as crianças de hoje, quando forem adultas irão lembrar dos personagens com quem elas passam as manhãs? Ou será que os desenhos perderam tanto espaço para os vídeo-games e computadores, que serem apelativos foi só o que restou?

E para você, amigo leitor, qual o desenho da sua infância?

domingo, 17 de julho de 2011

Dia de Baden Powell

Baden Powell, amigos. Ainda que sem nenhum motivo aparente, preciso começar a semana falando sobre Baden Powell.

Não sei dizer há quanto tempo Baden é o meu grande ídolo na música brasileira, lado a lado com João Bosco, assim como também não sei se ouvir o Baden é que me comove ou se eu que recorro a ele quando estou comovido, por algum motivo. Quem ouvir Samba Triste, por exemplo, há de me entender.

Baden é um dos maiores violonistas de todos os tempos e um dos grandes compositores brasileiros. Não há nada de novo nisso. Mas me chama a atenção também a voz dele, uma voz frágil, que em nada lembra a de um cantor, mas que é muito agradável de ouvir. O Baden velhinho tem uma certa voz sábia de avô.

As parcerias mais clássicas de Baden são com Vinícius de Moraes, com quem compôs Samba da Bênção (clássico de formaturas) e os afrosambas (Canto de Ossanha, Berimbau, etc.). Mas ele também tem ótimas parcerias com Paulo César Pinheiro (Lapinha) e Billy Blanco (Samba Triste), entre outros.

Baden tem sons de profunda melancolia e de singela alegria. Não é para todas as horas, requer alguma introspecção. Não desperdicemos o Baden nos fones de ouvido da volta pra casa, por exemplo.

Também não desperdicemos o Baden lendo estas palavras sobre ele. Afinal, podemos ouvi-lo nos links abaixo:

Samba Triste (ouvir) (ouvir - instrumental)

Lapinha (ouvir)

Tem dó (ouvir)

Round Midnight (ouvir)

Trecho de um pocket show em Paris (ouvir)

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Década e meia de rock

No Dia Mundial do Rock, uma cronologia apressada, porém honesta, do gênero na vida deste blogueiro.

1996 – 1997 - Aos 10 anos, só ouvia o Acústico MTV dos Titãs, presente de aniversário que tinha tudo pra dar errado, pois eu não ouvia rock, mas que funcionou. Época de Mamonas Assassinas e de ouvir as bandas do Planeta Atlântida.

1998 - Conheço o Alive III do KISS. Desenhava Gene Simmons no caderno, aprendia inglês traduzindo letras inteiras. Está no meu MP3 player até hoje.

1999 – Fã de KISS, conheço outras bandas, mas sem estabelecer grandes vínculos. As bandas preferidas dos meus colegas eram Iron Maiden, Black Sabbath, Os Raimundos, Tequila Baby.

2000 – Dou uma chance ao Guns N’ Roses e viro fã. Live Era 87-93 é o álbum que mais ouvi na vida, sem sombra de dúvidas. Também conheço Rage Against The Machine, mas à primeira audição não chega a me emocionar muito. Deixo o cabelo crescer.

2001 – Logo em janeiro, assistindo o Rock in Rio III, viro ainda mais fã de Guns. No colégio, começamos com a banda Jack Daniel’s. Época de se envolver em polêmicas com pagodeiros. Será que ainda existe isso?

2002 – Resolvo ceder às influências da minha mãe, que sabe tudo de rock e há tempos insistia para que eu ouvisse Eric Clapton, Stones, Janis Joplin e Led Zeppelin. Bendita influência!

2003 – Assistindo a um especial na MTV, conheço The Doors. E Jim Morrison é meu maior ídolo até hoje. Graças a Jim, chego ao Blues, à literatura Beat, à contracultura em geral e passo a dar ainda mais atenção ao rock dos anos 60.

2004 – 2005 - Corto o cabelo. Nas aulas de violão com o mestre Luis Fernando, conheço João Bosco. Neste período, quase só escuto MPB, principalmente Baden Powell e Chico, além do próprio João. Em novembro de 2005, o show do Pearl Jam, no Gigantinho, foi o primeiro grande show que assisti. Foi demais.

2006 – Resolvo que quero ouvir só blues. Afinal, o que não for blues, não cabe na vida de um bluesman. Etta James vira minha cantora favorita.

2007-2009 – Começo a virar menos roqueiro, mais jazzista. Mas também, com a internet cada vez mais rápida, é a época de baixar discografias de todas as bandas imagináveis e não ouvir quase nada.

2010 – Assisto ao vivo, em Porto Alegre, Guns N Roses em março e Aerosmith em maio. Minha adolescência, enfim, pode descansar em paz. Conheço Canned Heat e Going Up The Country é a música que mais escuto no ano.

2011 – Concluo que, nestes anos todos, nunca dei a Bob Dylan a atenção que ele merecia. E há duas semanas, só escuto Bob Dylan.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Simplifique

Quanto mais simples, melhor. Estou cada vez mais convencido de que esse é o princípio básico da nossa busca da felicidade, que já é felicidade em si.

Admiro tudo que resta intocado pela sofisticação. A culinária simples, por exemplo. Por mais repetitiva que possa ser, deixo o paladar refinado para os que vivem a vida refinada. Fico com o arroz, o bife e a batata frita.

Relacionamentos têm que ser simples, se é que isso é possível. Quantos não terminaram tendo como explicação somente o fato de ser complicado? Até as brigas devem ser simples, para os dois lados entenderem o por quê.

Simples deveriam ser todas as nossas ações e reações cotidianas e também nossas perguntas para a vida. Que sejam simples, elementares e despretensiosas. E sem esperar por respostas, já que essas são tudo, menos simples.

Vamos viver como um blues de poucos e simples acordes, soando no mesmo ritmo, para comportar melhor o improviso melódico. Se a vida é um improviso, quanto mais simples for, erraremos menos. E se o caminho percorrido foi simples, smpre saberemos para onde voltar

Não nos desperdicemos, portanto, nas complexidades que estão aí. Sejamos, nós mesmos, auto-sustentáveis. E cada vez mais, busquemos simplificar.

terça-feira, 5 de julho de 2011

O simpático Tim-Tim

Enquanto uma nova crônica que venha para revolucionar os costumes do nosso século não surge por aqui, compartilho essa materinha que saiu no clicBento e na ZH do último dia 1º. É a história de uma sacada bem bacana dos vizinhos de Garibaldi.

Turismo direto do front

Há mais de duas décadas, um veterano da 2ª Guerra Mundial passeia diariamente pelas ruas de Garibaldi, na Serra. Trata-se do Tim-Tim, um legítimo caminhão do exército dos anos 40 transformado em um elegante ônibus de turismo.

A história do Tim-Tim – nome alusivo ao brinde de champanhe, bebida que é um dos símbolos de Garibaldi – começa, ou recomeça, em 1990, quando foi adquirido pela prefeitura junto ao exército brasileiro. O prefeito da época viu o caminhão parado em um quartel de Porto Alegre, e imaginou que poderia dar a ele uma nova utilidade. E desse dia até o primeiro passeio pelo centro histórico do município de 30 mil habitantes foi só o tempo de reformar a cabine e substituir a carroceria pelo reboque que o transforma num ônibus para até 50 passageiros.

Durante o período da guerra, entre 1939 e 1945, foram fabricadas mais de 500 mil unidades destes caminhões militares, que serviam para o transporte de tropas e de suprimentos para o front. Mais de 60 anos depois, poucos continuam trafegando, e dificilmente algum outro tenha mudado tão radicalmente de função.

Há 20 anos na boleia do Tim-Tim, Renato Corbelini conta com orgulho histórias dos turistas que já conduziu, transportando desde um grupo de freiras de diversos países até atores e atrizes globais. E o parceiro nunca o deixou na mão.

- Estamos sempre atentos à manutenção do ônibus, que é mesmo muito antigo, mas ele jamais nos deu problema. O único problema é a quantidade enorme de gasolina que ele consome – brinca.

Os passeios são agendados pela Secretaria de Turismo de Garibaldi, e ocorrem geralmente nos finais de semana, sempre conduzidos por um guia de turismo que conta a história do município. Na semana passada, foram feitas reformas na lataria e alguns reparos na pintura. Tudo para deixar o velho Tim-Tim ainda mais bonito para o inverno.

domingo, 3 de julho de 2011

Trajetos

Sou apegado a certos trajetos. O ritual de cumpri-los diariamente, principalmente o da volta do trabalho para casa, no finzinho da tarde, é uma agradável rotina que cultivo há bastante tempo.

No frio quase congelante dessa época, com um vento batendo no rosto, mãos no bolso da jaqueta, sem pressa para chegar, cultuando a invenção da touca, da luva, dos fones de ouvido, tudo é bom humor na volta pra casa, ali pelas 18h30.

Caminho 20 minutos nesse caminho trabalho-casa. Além de revigorante, ainda tem a vantagem de ser um hábito saudável, o que nunca foi uma das bandeiras que ergui na vida.

Cumprir com um mesmo trajeto todo santo dia nos torna íntimos das ruas por onde passamos. Das vitrines das lojas; dos rostos nas paradas de ônibus; dos malabaristas prateados do sinal vermelho, do fim de expediente do comércio e das repartições públicas.

Todos os envolvidos somos partes de um cenário que nós mesmos protagonizamos e repetimos diariamente, e gosto de saber disso enquanto caminho.

Quase chegando em casa, há ainda a irresistível vitrine da pet shop, com seus filhotes de cães e gatos que geralmente dormem tranqüilos, alheios ao caos do mundo lá fora. Na última esquina, o trailer do cachorro quente sempre bombando. E então o lar.

É inevitável que um dia a rotina mude, que outros caminhos surjam, e que eu sinta falta de meu trajeto diário do fim da tarde. E me pergunto se, como toda boa relação que chega ao fim, sentirá ele minha falta também.



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segunda-feira, 27 de junho de 2011

Terapia da fofoca

Estou convencido de que minha vizinha elevou a fofoca ao mais puro estado de entretenimento. E com ela descobri que a fofoca generalista e impessoal tem lá sua graça, afinal.

Essa jovem senhora de 60 e poucos anos e eu fofocamos quase que diariamente, geralmente antes, durante e na saída do elevador. Como ela desce alguns andares abaixo, chego a ficar segurando a porta por alguns minutos, enquanto o papo não se esgota. E nunca citamos um nome sequer.

Hoje, por exemplo, falamos sobre um vizinho que fez a mudança pelas escadas e danificou as paredes com a quina de algum móvel. Não sabendo quem era o tal vizinho, criticamos genericamente os vizinhos que se mudam sem os devidos cuidados, estejam eles de chegada ou de saída. E sem ofender ninguém, nem mesmo os bons costumes.

Já desabafamos contra todos os vizinhos sem nunca ter criticado um que fosse, por não saber de quem estamos falando. É o que atira bitucas de cigarro, o que carrega o lixo sempre depois do caminhão passar, o que abre as correspondências deixadas sobre o balcão do hall de entrada. Boas deixas não faltam. Podemos fofocar até sobre eu mesmo, sem que a vizinha saiba de quem estamos falando.

Às vezes minha vizinha e eu nos encontramos no portão, às vezes ela está regando as flores. Encontro-a com a freqüência que encontro a todos os outros moradores somados. Acho que ela passa o dia analisando o cotidiano do prédio, a quem cuida como um filho.

Confesso que em alguns dias a maior interação social que experimento são os 10 minutos de fofocas com essa senhora simpática e indiscreta. A fofoca que não se interessa pela vida dos outros é uma fofoca simplesmente pelo prazer da fofoca. Uma fofoca terapêutica.

São sempre elogiáveis as relações superficiais da vida.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Jazz na sexta

n. 4 – Freedom, de Charles Mingus

A quarta edição do Jazz na Sexta traz o jazzista preferido deste blogueiro (que se já disse o mesmo sobre outro, mentiu): o baixista e compositor Charles Mingus. O tão genial quanto perturbador Charles Mingus, e sua banda igualmente fantástica, com Charlie Mariano no sax e Dannie Richmond na bateria (dois nomes que não figuram entre os graaaandes do jazz, mas que simplesmente deveriam).

Ninguém que justifica minimamente sua passagem por esta vida deve ficar indiferente ao som de Mingus. É um exagero, óbvio, mas necessário para ilustrar o quanto admiro esse cara, de quem já devorei a não-tão-bem-escrita autobiografia.

Mingus já esteve aqui no blog antes, é bom lembrar. Desta vez, a música qe compartilho com os amigos leitores é outra: Freedom, que fecha o álbum intitulado Mingus Mingus Mingus.

A peculiaridade deste som é o coral que abre a música, cantando duas belas estrofes, que são seguidas por instrumental realmente empolgante. Vale ouvir e depois ouvir de novo. As noites de inverno estão aí pra isso.

Charles Mingus - Freedom

segunda-feira, 20 de junho de 2011

5 ou 6 desejos para o inverno

21 de junho. Que o inverno, enfim, seja bem-vindo, e que proporcione dias e noites inesquecíveis para nossas retinas e nossos afetos.

Que meus gatos durmam suas 18 horas diárias ao redor do fogão ou aninhados nas roupas que conseguirem puxar do roupeiro, enquanto penso neles a 180 km de distância.

Que as mulheres fiquem cada vez mais belas e únicas na estação que melhor favorece os estilos mais diversos.

Que os donos de bar sejam complacentes e não encerrem mais cedo o expediente em nossos escritórios em pleno início da reunião.

Que a neve dê as caras como em seus anos mais eloqüentes, nem que seja por um dia apenas, pois quero tirar uma foto.

Que vá embora deixando saudades, nenhum dia antes de 22 de setembro.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Viver com açúcar

O tempo nos torna menos felizes ou apenas mais questionadores da felicidade? Tudo o que faço parece ser pela ilusão de reviver. Estou sempre querendo voltar ao que em determinado tempo me fez mais feliz.

Em tudo o que faço, acabo reencontrando algum vínculo com as boas lembranças, que afinal são boa parte do que temos para continuar a vida. Boas lembranças do passado e boas idéias para o futuro, eis o que nos move.

Posso sentar para escrever numa noite fria sem ter nada a dizer, mas preciso reviver as frias noites em que sentei para escrever tendo algo a dizer. E para isso ouço as mesmas músicas, deixo ao meu lado os mesmos objetos, a mesma caneca de café, faço do presente um cenário para representar o que já vivi.

Passo por uma locadora de vídeo-games e invariavelmente enxergo a mim mesmo com 12 anos, passando as tardes cultivando o primeiro vício da vida. Penso que deveria comprar um vídeo-game, reviver mais essa felicidade. A idéia só sai da cabeça quando lembro que as tardes já não são mais livres, assim como as manhãs, as noites, as madrugadas. Nos consumimos facilmente.

Em um supermercado, tudo me lembra a infância, principalmente os pães de mel que minha vó comia e sempre me dava um. Não sei passar indiferente pelo pão de mel na prateleira.

Penso onde estaria hoje a garota do primeiro beijo. Acho que só por nunca mais tê-la visto é que a lembrança se faz tão boa. O passar dos anos vai mitificando as pessoas que se ausentam da nossa vida e tornando-as cada vez melhores, conforme não as encontremos de fato.

Não faltam exemplos do quanto revivo, de fato ou no pensamento. Termino parafraseando Verissimo (o Luis Fernando), que certa vez disse que ser avô é o mesmo que ser pai, só que com açúcar. Reviver é como viver. Mas com um pouco mais de açúcar.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Novidades

Enquanto uma nova crônica imprescindível para o duvidoso futuro da humanidade não é publicada, este blogueiro aproveita para alertar os amigos leitores das novidades da casa.

A frase que abre o blog, no topo da página, por exemplo. Mudou. Sai o “Andreinews está de volta...” que, mais de um ano depois, já estava ficando um pouco defasado, e entra uma bela citação de Paulo Mendes Campos, retirada de uma entrevista dada ao Pasquim.

Na barra lateral, apresentamos os textos mais lidos e comentados desde que este blog entrou no ar, e os comentários mais recentes deixados pelos visitantes, sejam eles sócios ou não.

Finalmente, também na barra lateral, o registro de alguns momentos da breve e saudosa produção audiovisual no Portal3, minha primeira segunda casa. São vídeos bem legais (eu acho), que foram muito divertidos de fazer e me deixam muitas boas lembranças do ano de 2009.

E tudo isso de graça.

sábado, 11 de junho de 2011

Aos casais dessa minha vida


Feliz Dia dos Namorados, casais dessa minha vida!

Aos meus amigos, que, sem exceção, merecem os parabéns pelas namoradas que escolheram. E, principalmente, às namoradas dos meus amigos, que sem ressentimentos dividem com este inconveniente cronista a companhia de seus amados nos momentos em que a boêmia - tão alheia ao romantismo - se faz o mal necessário de nossas existências.

Queridos amigos de vidas compartilhadas. Que neste dia 12 de junho, o contrato de felicidade seja renovado por outros 364 dias. Com opção de renovação eterna, sem multa rescisória.

Jazz na sexta


n. 3 - So What, de Miles Davis

O Jazz na sexta desta semana, excepcionalmente postado no sábado, traz o gênio Miles Davis. Compositor que por várias vezes revolucionou o jazz, sendo o criador e principal difusor de novas vertentes, como o cool e o fusion, é também um trompetista de melodias incríveis.

Miles foi o primeiro jazzista que aprendi a gostar, lá pelos idos de 2004, através do algum Live Around The World, fantástico, principalmente para alguém que só ouvia rock. A guitarra do Mike Stern e o baixo de Daryl Jones (hoje nos Stones) foram uma boa forma de transição de uma fase roqueira para outra jazzística deste blogueiro.

Mas o que temos aqui neste post é Miles em sua melhor fase, e em melhor companhia. Na relaxante So What (algo como "e daí?"), do clássico Kind Of Blue (1959), o álbum de jazz mais vendido da história, dão o ar da graça músicos como o pianista Bill Evans e os saxofonistas Cannonball Adderley e John Coltrane.

Contemple a vida escutando os solos de So What.

Miles Davis - So What

terça-feira, 7 de junho de 2011

O dia ruim

Cadê a felicidade que estava aqui? Que tristeza foi aquela que me abateu ontem e, sem avisar, chorando se foi? É incrível como o nosso estado de espírito pode variar tanto de um dia para o outro, quando não da noite para o dia.

Creio que só pode ser pela coexistência em nossa vida, o tempo todo, de todos os elementos do drama e da comédia. Nunca faltam motivos para estarmos afundando em melancolia ou em radiante alegria. Somos reféns da memória curta e de uma tendência ao sensacionalismo.

Fato é que não costumamos viver um dia ruim como apenas um dia ruim. O dia ruim nos dá impressão de uma vida ruim. Alguma vez tudo, tudo mesmo, esteve errado? Claro que não. Mas vá se dar conta disso nas piores jornadas diárias.

Sabendo que não haverá dia em que um grande problema destrua tudo o que já nos fez e nos faz felizes, por que sucumbimos às vezes e temos tantas noites mal-dormidas? Noites em que, não bastando nosso infortúnio, avaliar como o mundo tem sido ingrato com tanta gente? Dá vontade de voltar para o útero.

Por isso que é imprescindível saber conviver com o dia em que nada deu certo. Evitar querer, justo neste dia avaliar, todo o resto que nos cerca, pois o mau humor a tudo distorce. Se estamos bem de saúde, se as pessoas que amamos estão bem e preocupadas conosco, se não nos falta algo de muito necessário para levar a vida, um dia ruim não pode ser nada além de um dia ruim.

Enquanto as respostas forem positivas, como normalmente são, vamos conviver, sem traumas, com o dia ruim.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Jazz na sexta


n.2 - Epistrophy, de Thelonious Monk

A segunda edição do nosso já tradicional Jazz na Sexta traz a finíssima Epistrophy, do pianista Thelonious Monk, um dos primeiros ídolos jazzistas deste blogueiro. Verdade que é uma composição em parceria com o bom baterista Kenny Clarke, mas isso é detalhe.

Monk é um dos mais geniais compositores e nem precisa que coloquemos o óbvio complemento “da história do jazz”. Independe de gênero ou época para estar entre os maiores. E, advinhem só: era um excêntrico. Gostava, por exemplo, de abandonar o piano em seus shows para dançar ao som da banda ou simplesmente ficar girando no mesmo lugar, como se estivesse hipnotizado. Daí pra pior.

Menos mal que a excentricidade do Thelonious, que tem um belo nome, diga-se de passagem - é proporcional à criatividade e originalidade de cada música que ele deixou. E isso não sou eu quem diz, mas gente que entende, avalizada. Eu só absorvo e formo minhas frases.

Em Monk, cada nota soa racionalmente escolhida e tocada. Por trás da aparente estranheza das melodias, suas composições são coerentes e lógicas, revelando uma combinação do jazz tradicional, do swing e do blues...” escreveu Carlos Calado, no livro-CD sobre Monk da coleção da Folha de S. Paulo.

Para este post, escolhi Epistrophy, de 1942, e não Round Midnight – a mais bela e que já postei aqui –, pela versão histórica que todos vão poder conhecer.

Trata-se de um show em que Monk divide o palco com o grande saxofonista – principiante à época - John Coltrane, no Carnegie Hall, em Nova York, e cujo registro em áudio só foi aparecer quase 40 anos depois, encontrado em algum porão da vida de alguém.


Thelonious Monk - Epistrophy

terça-feira, 31 de maio de 2011

Bons momentos com Woody Allen

Tenho folheado alguns livros que há tempos não viam qualquer espécie de luz. Bom para dar uma oxigenada, tanto nos livros quanto na memória. E quando fui reler os trechos que havia sublinhado do ótimo Que Loucura!, do Woody Allen, achei que iria enfartar de tanto rir. Compartilho abaixo alguns deles:

...lembro-me de ter olhado o relógio. Eram precisamente 4h15 da manhã. Tenho certeza disto porque nosso relógio está parado há 21 anos nesta hora.

Eu e minha filha o levamos à ópera em Milão. No meio do segundo ato, Needleman debruçou-se no balcão do camarote e caiu no poço da orquestra. Orgulhoso demais para admitir que tinha sido um acidente, passou a ir todas as noites na ópera e a cair lá de cima.

Quando morreu, Needleman estava, como sempre, trabalhando em diversos projetos. Um deles era a criação de uma nova Ética, baseada em sua teoria de que ‘os bons costumes são não apenas mais morais, como podem ser praticados por telefone’”.

E onde fica a ciência quando alguém lhe propõe os eternos mistérios, tais como: De onde se originou o cosmos? (O próprio, não o time de futebol.) Há quanto tempo existe? A matéria se iniciou com uma explosão ou por ordem de Deus? Se a segunda hipótese é verdadeira, por que não começou Ele o serviço duas semanas antes, ainda a tempo de curtir o verão?

O Dr. Brackish Menzies, que trabalha no Observatório de Monte Wilson, ou está em observação no Hospício de Monte Wilson (sua letra não é muito legível), afirma que, se tais seres (extraterrestres) viajassem à velocidade da luz, levariam milhões de anos para chegar à Terra, e que, a julgar pela má qualidade das peças atualmente em cartaz , tal expedição dificilmente valeria a pena.”

domingo, 29 de maio de 2011

Minha alma gêmea (lê romances pornográficos)

Livros catados pelos sebos da vida sempre reservam alguma surpresa. Além de comprar obras de valor inestimável por cinco ou dez pilas, levamos de brinde uma que outra maravilha rabiscada pelos donos anteriores.

Já há algum tempo, arrematei O Muro, de Jean Paul Sartre, em um sebo de São Leopoldo. Na folha de rosto, a pequena Sandra – criança, como a letra denuncia - devia estar brincando de completar títulos de livro. Escreveu na folha de rosto: “do meu jardim”. Na última página, achando incompletos os dados sobre o autor, Sandra acrescenta lindamente ao lado do ano de 1980(!): “omde acomteseu a guerra mundial”. Fico imaginando o que a pequena Sandra, alfabetizada a obras existencialistas, poderia estar fazendo hoje em dia.


Os leitores gostam de enriquecer os livros legando suas opiniões, impressões, devaneios para a posteridade. No meu Bom dia para os defuntos, de Manuel Scorza, um leitor sublinhou a frase “Deus dava de ombros desdenhoso”, e arriscou uma piada na margem: “dar de ombros divino”. Socializando, na última página este blogueiro expõe tudo aquilo que pensou sobre o livro: “o capítulo 9 é sensacional”. Um dia alguém há de concordar ou discordar.

Finalmente, o melhor exemplo disso tudo encontrei não em um sebo, mas num exemplar retirado na biblioteca da faculdade. Era A Casa dos Budas Ditosos, pornografia disfarçada do baiano João Ubaldo Ribeiro. Lá pelas tantas do romance, ao lado de uma passagem realmente engraçada, a leitora anota assim: “se você morreu de rir com esse parágrafo, é minha alma gêmea”. E assina embaixo um nome que já esqueci.

Como eu havia morrido de rir com aquele parágrafo, descobri não apenas que almas gêmeas existem, mas também que eu tinha a minha. Não é lindo isso? Quantas risadas estamos deixando de dar juntos, minha alma gêmea e eu? Foi pelo benefício da dúvida que preferi não responder.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Jazz na sexta

Nesta sessão que inicia hoje, este blogueiro emocionado traz toda semana um jazzinho, com breves comentários. A intenção é brindar os amigos apreciadores e, quiçá, atrair novos ouvintes para o gênero.

n.1 - Groovin’ High, de Dizzy Gillespie

Todo clássico do jazz (os standards) já foi regravado à exaustão, por incontáveis músicos, ligados ao gênero ou não. Comparando com o rock, é como se toda banda já tivesse feito uma releitura de Stairway To Heaven ou Smoke On The Water e lançado em álbum.

Groovin’ High, música que dá início a esta sessão, foi composta pelo trompetista Dizzy Gillespie, as bochechas infladas mais famosas e virtuosas do jazz, em 1945, iníco da era bebop, movimento mais legal em mais de um século de reviravoltas de New Orleans ao contemporâneo.

Em uma busca rápida pelo meu HD via Windows Media Player, encontro cinco versões de Groovin’. Trata-se de um jazz rápido e empolgante, que parece feito para trilha sonora de comédia pastelão. Todo vídeo de humor poderia ter um jazz de Charlie Parker (em breve) ou Dizzy Gillespie como pano de fundo.

Abaixo, duas versões deste som. A primeira, com o próprio Dizzy, a segunda, a preferida deste blogueiro, com o saxofonista Lou Donaldson.

Groovin' High - Dizzy Gillespie

Groovin' High - Lou Donaldson

terça-feira, 24 de maio de 2011

Os males da coluna diária

Podem cobrar futuramente, mas duvido que este blogueiro venha um dia a se aventurar no ofício de colunista diário, seja de jornal, site ou blog mesmo.

Sem entrar nos méritos da inspiração e do talento, que também podem faltar a este cronista, o requisito que certamente não cumpro é o desapego pelos meus escritos.

Sou muito apegado ao que escrevo. Lembro de cada título, de cada argumento, de cada frase que já tenha agradado a alguém, de cada comentário Se produzisse 365 textos por ano, como daria atenção a cada um deles? Crônicas são filhos que coloco no mundo. Sou a mãe, o leitor assume a paternidade.

Alguns textos são produtos de semanas de pensamentos, de inúmeras tentativas e erros, e até de desistência temporária, até que retorne a ele após aquela sacada que faltava e que surge inesperadamente. É um ritual dramático e às vezes desgastante (para este que vos escreve. Nada de generalizar).

Todo esse envolvimento faz do texto uma experiência difícil de imaginar enquanto exercício diário sem a impressão de que estaria banalizando o que mais gosto de fazer.

Paulo Sant’Ana, cronista idolatrado por este aprendiz, publicou 16 mil colunas em Zero Hora. As melhores, as mais árduas, para não condená-las à efemeridade da página de jornal, reuniu em três livros. Por três vezes, voltou do sótão com uma caixa cheia, carregando só o que o tempo não estragou. É um apegado ao texto, mas que ocupa os lapsos de inspiração com mais textos, alguns descartáveis. É cronista refém da coluna diária.

O colunista diário tem que ter muito a dizer. Dizendo muito, esquece muito o que já disse. Prefiro esquecer pouco. E não tenho tanta coisa assim a dizer.